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Depois talvez não exista o depois! Por Sami Goldstein

Uma narrativa que costuma ser atribuída a Esopo, autor da Grécia Antiga, mas que também foi contada em versos pelo francês La Fontaine e teve inúmeras adaptações, fala sobre a cigarra que passou o verão cantando, enquanto a formiga juntava seus grãos. Quando chegou o inverno, a cigarra veio à casa da formiga para pedir que lhe desse o que comer. A formiga então perguntou a ela “e o que você fez durante todo o verão?”. “Durante o verão eu cantei”, disse a cigarra. A formiga respondeu: Muito bem, pois agora dance! E voltou ao seu trabalho. A fábula tão antiga e ao mesmo tempo rica, ensina o básico: os preguiçosos colhem o que plantam. Isso me lembra uma antiga propaganda das Casas Pernambucanas “quem bate? É o frio!”. E o frio e tenebroso inverno parece aproximar-se de nossas portas com cada vez mais intensidade.

Um recente relatório do Banco Mundial já impacta em seu título. Chamado de “”Colapso e Recuperação: como a Covid-19 deteriorou o capital humano e o que fazer a respeito”, o documento oferece uma análise abrangente dos dados globais, mostrando que a pandemia de Covid-19 destruiu o capital humano em momentos críticos do ciclo de vida, deixando marcas em milhões de crianças e jovens em países de renda baixa e média. Essas perdas de capital humano ameaçam reduzir os ganhos no decorrer da vida e aumentar a desigualdade social nas próximas décadas. Segundo o estudo, as crianças de zero a cinco anos dessa geração podem ter rendimentos até 25% menores por causa da pandemia. E aquelas com idade entre 6 e 14 anos podem receber até 17% menos como remuneração pelo trabalho. Os jovens de 15 a 24 anos também carregam os efeitos desse choque nos estudos e no emprego. Nas palavras da própria instituição, “os países devem resolver esses problemas, ou enfrentarão gerações de crianças e jovens marcados pela pandemia, resultando em um golpe catastrófico no desenvolvimento econômico.”

É preciso agir agora se quisermos minimamente projetar o futuro. Estamos diante de um cenário hollywoodiano de apocalipse social em que deixar para depois possivelmente signifique que o depois não mais exista. A pandemia – que ainda não acabou, importante sempre lembrarmos – trouxe diversos impactos. Sem sombra de dúvidas que as mortes foram os mais marcantes, mas seus efeitos a longo prazo podem ser ainda mais destrutivos. Governos precisam pensar mais como motivadas formigas do que como acomodadas cigarras. Enquanto “cantamos”, o futuro de nossas crianças se desenha em cenários de pobreza e falta de perspectivas. E a bola de neve se agigantará ao ponto de os mesmos governos – hoje inertes – sentirem nos bolsos com perda de postos de trabalho, receita e desenvolvimento. Passou da hora de sair do comodismo e plantar mãos que criam. Como na antiga propaganda, o frio bate à porta. Precisamos de foco e metas de qualificação e profissionalização de nossos jovens.