Impedido por lei de ser candidato a prefeito de Sumaré, Dirceu Dalben faz manobra política para tentar comandar Paulínia, podendo judicializar as eleições 2024
Mesmo que estabeleça domicílio eleitoral em Paulínia, especialistas em Direito dizem que candidatura pode ser impugnada por caracterizar abuso de poder econômico e “prefeito itinerante”
No dia 21 de julho, em entrevista ao jornal Liberal, de Americana, concedida à jornalista Cristiani Azanha, o deputado estadual Dirceu Dalben, ex-prefeito de Sumaré, afirmou tem pretensão de disputar a próxima eleição para a Prefeitura de Paulínia. A declaração gerou polêmica e controvérsias nos meios político e jurídico.
Para alguns, o posicionamento gerou surpresa, pois Dalben, que hoje exerce o cargo de deputado estadual pelo partido Cidadania, tem raízes com a cidade vizinha Sumaré, onde exerceu o cargo de prefeito.
O filho de Dirceu, Luiz Alfredo Dalben, também do Cidadania, é o atual prefeito de Sumaré e está no seu segundo mandato. Pela legislação vigente, Dirceu não pode disputar o próximo pleito para prefeito em Sumaré devido aos laços consanguíneos que têm com o filho, conforme o Artigo 14, parágrafo 7° da Constituição Federal.
Na entrevista ao jornal Liberal, Dirceu Dalben disse que pretende estabelecer o seu domicílio eleitoral em Paulínia e, com essa manobra, concorrer ao cargo de prefeito nas próximas eleições.
O atual domicílio eleitoral de Dirceu Dalben é na Escola Manuel Albaladejo Fernandes, na Chácara San Martin, região de Matão, em Sumaré.
No meio político paulinense, a declaração repercutiu de forma negativa, porque o político com raízes em Sumaré, não tem qualquer tipo de vínculo com a comunidade. Alguns políticos, inclusive, classificaram a intenção como algo oportunista.
A estratégia, caso confirmada, seria semelhante ao fato acontecido em 1990 com o ex-presidente José Sarney. Na época, o cacique político maranhense mudou o domicílio eleitoral para o Amapá, estado pelo qual concorreu a uma vaga ao Senado.
Sarney é um político conhecido pela astúcia e, conforme análises feitas na época, aproveitou uma brecha na lei, candidatou-se pelo Amapá com o intuito de se manter no poder.
No mundo político, as práticas adotadas nem sempre são as mais republicanas, pois variam de acordo com os interesses dos grupos em que os políticos estão inseridos. Nesses casos, nem sempre o bom senso e a ética prevalecem. Paulínia é um município que desperta a atenção de muitos, porque é uma cidade próspera e que conta com uma grande arrecadação de imposto.
E, depois de viver durante anos cenários políticos conturbados, hoje a cidade vive momentos de tranquilidade jurídica e política. O período de tranquilidade se iniciou com a eleição do atual prefeito Du Cazellato (PL), em 2019, mas, caso a intenção de Dirceu Dalben se concretize, pode estar com os dias contados.
A reportagem do Tribuna apurou que Dalben pretende se aproveitar de uma brecha existente na legislação para tentar ser candidato a prefeito de Paulínia, uma vez que o filho Luiz Dalben, atual prefeito de Sumaré, está no segundo mandato. O artigo 14, parágrafo 7º da Constituição Federal, proíbe que parentes consanguíneos e afins, até o segundo grau ou por adoção, possam se candidatar na mesmo local onde mantém domicílio.
A possível candidatura de Dalben à Prefeitura de Paulínia, inclusive é apoiada por políticos locais como Edson Moura e sua mulher Nani Moura, ambos filiados ao MDB. Procurada pelo Jornal Liberal, Nani negou estar dando apoio a Dalben. A política, mulher do ex-prefeito Edson Moura, concorreu e perdeu duas eleições em Paulínia. Seu marido encontra-se inelegível pelos crimes e abusos de poder cometidos.
Caso se confirme a perspectiva, Paulínia poderá novamente ser assombrada pela judicialização da próxima eleição, o que traria insegurança jurídica para a população e para o futuro da cidade.
O que diz a lei
O deputado estadual Dirceu Dalben, de acordo com o artigo 14, parágrafo 7º, não poderá concorrer à sucessão do filho em Sumaré pois, nessa cidade, ele está inelegível. O atual prefeito Luiz Dalben está à frente da Prefeitura de Sumaré por duas gestões consecutivas e, o cenário ideal, para manter e ampliar a hegemonia do clã Dalben na Região Metropolitana de Campinas (RMC), seria a volta do pai ao Poder Executivo e, para isso, o deputado teria de se afastar do cargo para o qual foi eleito recentemente.
Mas o parágrafo 7º é incisivo quanto a possibilidade de Dirceu concorrer por Sumaré: “São inelegíveis, no território de jurisdição do titular, o cônjuge e os parentes consanguíneos ou afins, até o segundo grau ou por adoção, do Presidente da República, de Governador de Estado ou Território, do Distrito Federal, de Prefeito ou de quem os haja substituído dentro dos seis meses anteriores ao pleito, salvo se já titular de mandato eletivo e candidato à reeleição.”
Portanto, caso isso ocorra, Dirceu Dalben estaria se aproveitando da brecha existente no que tange à frase …”no território de jurisdição do titular” e, assim, com essa manobra, tentaria uma vaga para ocupar a cadeira de mandatário de Paulínia.
Entenda o caso
A estratégia de Dirceu Dalben é clara, uma vez que a legislação proíbe que ele seja candidato por Sumaré. A reportagem do Tribuna apurou que o processo está em andamento pelas declarações de Dirceu Dalben ao Jornal Liberal. Com a manobra, Dirceu Dalben, praticamente a um ano antes da eleição, procura criar laços artificiais com Paulínia e, dessa forma, tentaria comprovar junto à Justiça Eleitoral que fixou residência no município. Se a tese fosse aceita, o deputado estaria apto a disputar o pleito.
O Tribuna entrevistou dois advogados sobre a possibilidade, que foi classificada por ambos como “abuso de direito”. Eles afirmaram que a situação jurídica de Dirceu Dalben (Cidadania) para ser candidato a prefeito de Paulínia, não é tranquila e certamente, no momento oportuno, deverá gerar pedidos de impugnação de sua pretensa candidatura.
Segundo os especialistas em Direito, além de configurar uma possível fraude a ser alegada com relação ao domicílio eleitoral, na impugnação a candidatura de Dirceu Dalben (Cidadania) poderão também ser alegadas as seguintes teses jurídicas: como o fato de Sumaré fazer divisa com Paulínia, assim, os atos governamentais do atual prefeito de Sumaré, Luiz Alfredo Dalben (filho de Dirceu Dalben), poderão afetar a vontade popular em Paulínia, o que caracterizaria abuso do poder político e econômico;
Dirceu Dalben não pode ser candidato a prefeito de Sumaré, ele também não poderá ser candidato a prefeito de Paulínia pois, nas duas situações o próprio filho também não poderia ser candidato a prefeito de Paulínia, por causa da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF) denominada de “prefeito itinerante” (RE 637485). Dessa forma, a inelegibilidade do prefeito de Sumaré Luiz Alfredo Dalben (também do Cidadania), tanto para Sumaré como para Paulínia, alcança também seu pai, o deputado estadual, ante o disposto no parágrafo 5º do artigo 14 da Constituição Federal.
Um dos advogados consultados disse ainda que cônjuges e parentes de prefeito reeleito são inelegíveis para o mesmo cargo em município vizinho. É importante lembrar que, infelizmente, alguns políticos profissionais ainda têm problemas com as promessas feitas durante a época das eleições.
Muitos prometem que irão cumprir o mandato para o qual foram eleitos e convencem os seus eleitores disso. Recebem votos de confiança, mas na primeira oportunidade que têm, deixam os seus cargos, para investir em projetos que atendam os seus interesses pessoais ou mesmo dos grupos aos quais pertencem.