Em uma bela manhã do ano de 1995, um homem chamado McArthur Wheeler decidiu roubar dois bancos na cidade de Pittsburgh, nos Estados Unidos. O mais curioso foi o fato de não usar qualquer máscara ou disfarce e nem ao menos tentar se esconder das câmeras de segurança. Poucas horas depois, a polícia colocou as mãos na fita de vigilância e decidiu colocá-la no noticiário das 11 horas. Um informante identificou McArthur no vídeo e contatou a polícia com o nome do homem. McArthur foi preso no mesmo dia.
- Mas eu usei o suco de limão! – Exclamou o ladrão, incrédulo, ao ser levado à delegacia.
Sua lógica: como o suco de limão pode ser usado para escrever letras invisíveis que se tornam visíveis apenas confrontadas com uma fonte de calor, ele pensou que a mesma coisa funcionaria em sua pele. Ao espalhar suco de limão por todo o rosto, ele achou que se tornaria invisível para as câmeras de segurança do banco. Ele até verificou seu “truque” tirando uma selfie com uma câmera Polaroid. Qual não foi sua surpresa ao notar que seu rosto não apareceu na foto. Por isso, ele ficou completamente confiante em roubar os bancos, certo de que não poderia ser identificado. Após, os policiais concluíram que o filme da câmera devia estar estragado ou que McArthur errou o enquadramento, provavelmente cego de tanto suco de limão nos olhos. A história foi publicada num jornal de Pittsburgh e chamou a atenção de dois professores de psicologia americanos, David Dunning e Justin Kruger, que investigaram a ideia de que a confiança que as pessoas depositam no próprio conhecimento nem sempre tem a ver com a quantidade ou qualidade do conhecimento que elas de fato possuem. E o fenômeno de quanto menos uma pessoa sabe, mais ela acha que sabe ganhou um nome oficial em 1999: efeito Dunning-Kruger.
Ambos os professores teriam muito trabalho hoje em dia. Charles Darwin já dizia que “a ignorância gera mais frequentemente confiança do que o conhecimento”. Atualizando seu pensamento atemporal, a ignorância é a mais letal das armas, pois faz o ignorante ter confiança suficiente para combater o conhecimento. Não bastassem os filósofos com mestrado em pandemia, agora é a vez dos doutores em guerras, todos com vasta propriedade no que dizem nas redes sociais e cujos diplomas são prints do absurdo. O “me disseram que” a vacina contra a Covid-19 implantava um chip na pessoa evoluiu para experts em justificativas do que ocorre do outro lado do mundo. Nosso dia-a-dia passou de ouvir a palavra “comorbidade” para “nazificação”. E muitos comentaristas de telinhas expandem sobre o tema sem jamais ter tido contato com ele. Nasci, cresci e convivi com sobreviventes da Segunda Guerra. Vi com meus próprios olhos homens e mulheres marcados como gado. Em minhas redes sociais, nesta semana, comentei sobre a primeira viagem que fiz sozinho pela Lufthansa, ainda adolescente, tremendo de medo de ser morto pelas comissárias de bordo por ser judeu. Pois, para mim, até então, todos os alemães eram nazistas e todos culpados pelo que havia ocorrido a meu povo. E o que aprendi com o tempo? Que o conhecimento é nosso melhor aliado. Gurus de teclados falam sobre nazificação de um país cujo presidente é judeu assumido. Pode haver incoerência maior?
Pode! Principalmente quando o suco de limão é passado nos fatos. O efeito Dunning-Kruger é cada vez mais evidente. Quanto menos sabe, mais a pessoa acha que sabe. A autoconfiança da ignorância é mais assustadora e mortal que uma arma nuclear.